· Renata · Direito do Médico  · 4 min read

Cobrança de Taxa de Agendamento por Médicos - Prática Legal ou Infração Ética?

Faltas e cancelamentos de última hora geram prejuízos para médicos, levando muitos a considerar a cobrança de uma taxa antecipada. Enquanto os Conselhos de Medicina veem a prática como antiética, o Código de Defesa do Consumidor permite a cobrança desde que siga princípios de transparência e boa-fé.

Faltas e cancelamentos de última hora geram prejuízos para médicos, levando muitos a considerar a cobrança de uma taxa antecipada. Enquanto os Conselhos de Medicina veem a prática como antiética, o Código de Defesa do Consumidor permite a cobrança desde que siga princípios de transparência e boa-fé.

Cobrança de Taxa de Agendamento por Médicos: Prática Legal ou Infração Ética?

Introdução

Faltas sem aviso prévio e cancelamentos de última hora são realidades cada vez mais comuns em consultórios e clínicas médicas. Como consequência, profissionais da saúde têm enfrentado prejuízos financeiros e dificuldades na gestão de suas agendas.

Para lidar com o problema, muitos cogitam cobrar uma taxa de agendamento como forma de assegurar o comparecimento do paciente ou, ao menos, compensar o tempo reservado.

Mas essa cobrança é permitida? O tema suscita dúvidas relevantes, especialmente diante de posicionamentos divergentes entre a ética médica e a legislação consumerista.

Este artigo busca analisar a questão sob os aspectos ético-profissional e jurídico, oferecendo subsídios práticos para a atuação de médicos e gestores da saúde.


O que é a taxa de agendamento?

A taxa de agendamento consiste em um valor cobrado previamente à realização da consulta médica. A finalidade é compensar o tempo do profissional e os custos operacionais do atendimento quando o paciente não comparece ou cancela em cima da hora, sem que haja possibilidade de realocação da vaga.

Com a crescente frequência de ausências não justificadas, clínicas e consultórios passaram a adotar medidas para mitigar esses prejuízos, como:

  • Agendar mais de um paciente para o mesmo horário (o que pode gerar atrasos e superlotação);
  • Cobrar valores antecipadamente para responsabilizar o paciente pelo compromisso assumido.

O que dizem os Conselhos de Medicina?

Diversos Conselhos Regionais de Medicina e o próprio Conselho Federal de Medicina (CFM) já se manifestaram de forma restritiva quanto à prática da cobrança de taxa de agendamento.

A justificativa se apoia no art. 59 do Código de Ética Médica, que proíbe o médico de:

“Oferecer ou aceitar remuneração ou vantagens por paciente encaminhado ou recebido, bem como por atendimentos não prestados.”

De acordo com essa diretriz, a taxa de agendamento violaria a ética profissional, pois incidiria sobre um ato médico não realizado.

Posicionamentos de Conselhos Regionais:

  • CREMERJ (Parecer nº 06/2020): Considerou a cobrança como infração ao Código de Ética Médica, ressalvando a possibilidade da prática quando houver acordo prévio e expresso entre as partes.
  • CREMEC (Parecer nº 20/2020): Declarou que, apesar de não existir impedimento ético formal, a conduta não é recomendada, pois comprometeria a relação de confiança médico-paciente, colocando os honorários à frente da assistência à saúde.

E o que diz o Código de Defesa do Consumidor?

Sob a ótica jurídica, a relação entre médico e paciente, quando remunerada, é reconhecida como relação de consumo, nos termos do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Isso significa que os princípios da transparência, boa-fé, informação adequada e equilíbrio contratual devem ser observados.

Do ponto de vista legal, não há proibição expressa quanto à cobrança de taxa de agendamento, desde que a prática:

✅ Seja previamente informada ao paciente;
✅ Observe a finalidade contratual e compensatória, e não punitiva;
✅ Garanta possibilidade de reembolso em situações justificadas;
✅ Estabeleça regras claras de cancelamento, remarcação e conduta recíproca por parte do médico.

Assim, a cobrança pode ser juridicamente válida, se representar a contraprestação por custos administrativos, estrutura disponibilizada e tempo do profissional reservado — e não como valor vinculado ao ato médico em si.


Critérios para viabilizar a cobrança com segurança jurídica

Para que a taxa de agendamento seja adotada sem risco de judicialização ou sanções éticas, recomenda-se a implementação de uma política clara, documentada e formalmente pactuada com o paciente.

Boas práticas:

  1. 📜 Estabelecer política de agendamento e cancelamento, com linguagem acessível;
  2. Definir prazos mínimos para cancelamento sem custo;
  3. 🔄 Permitir reagendamento sem nova cobrança, dentro de prazo razoável;
  4. 💰 Prever reembolso da taxa quando a ausência for justificada;
  5. ⚖️ Estipular condutas recíprocas, como reembolso ao paciente em caso de desmarcação por parte do médico;
  6. 📄 Informar expressamente no ato do agendamento, por escrito, todos os termos aplicáveis;
  7. 📲 Confirmar a consulta com antecedência, preferencialmente por e-mail, mensagem ou aplicativo.

Conclusão

Embora seja considerada antiética por órgãos representativos da medicina, a cobrança de taxa de agendamento não é ilegal, desde que respeite os princípios do Código de Defesa do Consumidor e seja implementada com clareza, equilíbrio e boa-fé.

Sua adoção pode representar uma ferramenta legítima de gestão do tempo e valorização profissional, desde que acompanhada de informação adequada, pactuação prévia e sensibilidade nas exceções.

A chave está em equilibrar os direitos do paciente com a sustentabilidade do exercício profissional, promovendo uma relação de confiança e respeito mútuo.

Back to Blog
Coparticipação em Terapia ABA para Pessoas com TEA, O que diz a Lei e a Justiça

Coparticipação em Terapia ABA para Pessoas com TEA, O que diz a Lei e a Justiça

A terapia ABA (Análise do Comportamento Aplicada) é uma das abordagens mais recomendadas para o tratamento de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). No entanto, muitos beneficiários de planos de saúde enfrentam obstáculos financeiros impostos pelas operadoras, especialmente com a cobrança de coparticipação nas sessões.